terça-feira, 3 de maio de 2011

A última refeição da condenada

E ali, dentro de sua cela particular, trancafiada, Alice aguardava.
A última refeição da condenada.
O último vinho, a última carne, a última música...
Que demorava tanto e tanto, que a angústia, embora pacificada, a corroía...
Mas, estranhamente, Alice estava quieta, calma, quase passiva.
Para alguns condenados, a hora do fim se desenhava de uma maneira sórdida, como milhões de demônios de bocas abertas, prestes a engolir a vítima, rindo, de maneira louca da desgraça do pobre coitado...
Mas para Alice esse fim se desenhava como a hora de uma paz sublime, em que anjos a levariam pelas mãos e a resgatariam de um poço sem fundo.
Alice havia pedido tanto e seu tanto era tão pouco... Alice queria amor, mas seu algoz, seu capataz a havia feito compreender, finalmente, que isso não era pra ela.
Alice não nasceu pro amor... e a única pergunta que a atormentava era: "Ora, se não isso, por que ser tão plena desse sentimento?"
Mas Alice se cansou, até mesmo, de ouvir respostas. Alice se cansou de perguntar. Sua voz, já rouca, cansou de implorar.
E quando se deu por vencida, olhou para os lados e viu, finalmente, que não era tão ruim assim...
Amor, talvez, não tivesse mais, não teria mais, mas Alice se descobriu mulher. Mulher desejada, mulher querida. E ali, presa, Alice pediu, gentilmente, a chave ao carcereiro e saiu por uns instantes para ser feliz. Uma última e primeira vez.
Alice vislumbrou, então, um mundo colorido, do qual tinha medo, mas que era tão bonito, apesar de assustador, que se entregar era, ainda, dúvida. Mas a dúvida se dissipava, o temor, e ela estava prestes a se jogar em uma aventura que a libertaria de tudo o que achava incorreto e estranho.
Alice deu meia volta, retornou a cela, mas com a chave na mão. Primeiro se libertaria do sofrimento; depois se jogaria na felicidade, que estava ali, de braços abertos, esperando por ela.
A última refeição do sofrimento; o primeiro banquete de uma nova vida.
Uma coisa de cada vez.
E Alice havia aprendido a esperar, calma, vigorosamente.
Mas já dando pulos!
A vida não é ruim não, Alice...
Coma, beba, escute e então...
Viva Alice!
Viva!

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